Histórias
de Cinema:
Outros depoimentos
Cine
Captólio
O Capitólio foi o primeiro lugar que aprendi a ir sozinho, morava na outra quadra onde hoje é o Café Orion. Frequentei o Capitólio ainda antes da reforma, mas já apresentava indícios de má conservação, como aliás muitos prédios aqui da nossa cidade. Muito sentei nas poltronas dos mezaninos, ou segunda plateia como chamávamos e recordo que tinha janelas redondas, que para evitar a entrada de luz os vidros tinham sido pintados de preto, não sei como era a vedação originalmente, mas essa pintura já estava descascando a ponto de, com o tempo, ter ficado inviável assistir aos filmes nos assentos superiores, a falta de manutenção não é um problema de hoje. Lembro quando foi reformado, na época ninguém deu muita importância pela perda desse patrimônio, eram outros tempos não havia a consciência de hoje, a maioria aprovava o novo pelo novo e rejeitavam o velho pelo velho. Lembro das matinés de domingo que antes do filme tocava a banda “Brasilian Beatles", que tinha como um dos componentes o já falecido engenheiro Dawson Hoewel. Era o momento de trocarmos revistas em quadrinhos, os chamados “Gibis”. No palco lembro de assistir um show com Juca Chaves e tivemos também a presença de Tarcísio Meira e Glória Menezes para o prélançamento do filme “Independência ou morte” (tinha uma placa de bronze na parede, a direita de quem entra). Sempre achei um momento mágico quando as luzes se apagavam e o “gongo” ou sirene tocava três vezes anunciando que a projeção iria começar, aí então antes do filme e dos trailers eram projetados slides publicitários da agência Dawson Publicidade. Grandes filmes, tudo ao sabor das balas azedinhas adquiridas no balcão de vidro que ficava no saguão. Depois de transformado em estacionamento, cheguei a deixar meu carro lá, e claro, escolhi uma vaga mais ou menos no lugar que eu costumava sentar. A tela ainda estava lá.
Memórias de Breno Correia Filho
Cine Rádio
Pelotense
Não tem como falar no Cine Pelotense sem mencionar o momento mágico onde após o tradicional três toques de “gongo” as cortinas se abriam lentamente ao som de Êxodus, prática essas que durou até a sua última projeção. Lembro de quando foi inaugurado, alguns meses antes uma amostra das novas poltronas ficaram em exposição na lancheria da Farmácia Kautz, que ainda tinha a famosa porta giratória. Era uma cadeira em estrutura metálica e como de praxe o assento era escamoteável para facilitar o transito das pessoas, mas com um diferencial, ela se dobrava sozinha com ação de uma mola assim que levantávamos, eram em dois tons de verde e muito bem acolchoadas. Grandes filmes também passaram por esta tela, domingo as 10h da manhã tinha o matinal Tom e Jerry e desenhos animados variados, todos filmes do 007 com Sean Connery passaram lá, os dois dos Beatles também estrearam no cine Pelotense com filas que dobravam a esquina. Foi lá que conheci Federico Fellini com Satiricon, ainda não tinha ouvido falar dele, mas como era baseado em uma história de Petrônio, e eu sempre gostei de história antiga fui assistir, me impressionou tanto que fiquei para a segunda sessão para ver novamente, pratica essa que era comum e permitida, desde que o filme seguinte fosse o mesmo. Teve espetáculo de palco, lembro de pequeno me levarem para assistir um teatro de marionetes com os bonecos em escala natural.
Inesquecível. Depois o prédio foi usado como supermercado, o açougue e a fiambreria ficavam onde era o palco. Hoje o prédio está fechado.
Memórias de Breno Correia Filho
Cine Rei
Foi o mais novo de todos e o com menos conforto também, ficava na Rua Andrade Neves onde antes tinha sido a Loja “Arrozauto” uma filial da “Casa do Agricultor” do seu Joel Monteiro. Lá também assisti a grandes obras. Durante um período ficou conhecido como um cinema para seções de arte. Lá frequentaram Carlos Saura, Lina Wertmuller, Costa Gravas e Luis Buñuel. Deste último quando fui assistir “O Discreto charme da burguesia”, eu como adolescente bobalhão que era, fui reclamar do gerente que tinham na vitrine classificado o filme como “comédia”, ele ouviu pacientemente o que falei e no outro dia vi que tinha trocado por: “Sátira de costumes”. Tenho vergonha de lembrar disso, mas a classificação “Sátira de costumes” foi maravilhosa, aprendi com ele e uso este termo até hoje. Posteriormente as seções de arte foram para o Cine Tabajara. No Rei ficaram filmes de terror de segunda linha nas famosas sessões da meia noite, e um pouco antes de fechar vieram os filmes pornográficos, e no palco algumas apresentações ao vivo de espetáculos de sexo explicito. Hoje voltou a abrigar loja comercial.
Memórias de Breno Correia Filho
Teatro
Guarani
A lembrança mais antiga que tenho é dos espetáculos de fim de ano da Escola de Ballet Dicléa de Sousa, minha irmã estudou com ela muitos anos, e nessas ocasiões toda a família ia assistir. Eu sempre encontrava amigos e ficávamos brincando pelos corredores com lanternas de bolso que levávamos. Funcionou também como cinema regular, assisti grandes filmes com Peter Sellers, e velhos Westerns clássicos e muitos de terror como o “Frankenstein de Andy Warhol” em 3D com aqueles incômodos óculos. Lá também em determinado momento trocaram o equipamento de projeção e passaram a projetar em 70mm, se não me engano o filme que inaugurou essa nova bitola foi “O Calhambeque Mágico”. Nessa época já se notava uma grande deterioração das pinturas murais no teto da plateia, composta por anjos e querubins, nunca foram restauradas, rebaixaram o teto colocando um forro tipo pacote. Ainda na tela foi lá que ocorreu a mostra completa de Glauber Rocha, era um filme por dia, se comprava um passaporte que dava direito a ir a todas as projeções, realmente uma oportunidade única e inesquecível. No palco foram muitos shows, Caetano Veloso, Jô Soares, Roberto Carlos, Os Mutantes, Adriana Calcanhoto, Cássia Eller, Ney Matogrosso, Vinícios e Toquinho, Mariza Monte, Erasmo Carlos e o antológico show com a Rita Lee. Lembro que na segunda noite da Rita, a produtora do Jack Rubens (CAC Centro de Arte e Cultura) vendeu mais ingressos do que tinha de lugares, isso provocou uma revolta de quem ficou de fora, tanto que arrombaram uma das portas laterais e entraram a força, foram danificadas varias poltronas inclusive as cadeiras de palhinha dos camarotes. Felizmente não presenciei isso, tínhamos ido na noite anterior e ficamos em um camarote com algumas “lanças perfumes” na maior paz. Sediou também o “Latino Música” com a presença de Belchior, Arthur Moreira Lima, Luiz Melodia e grandes nomes. Palco até hoje de solenidades de formatura de diversos cursos. E não podemos esquecer também os bailes carnavalescos, tipo “gala gay” direcionados a comunidade LGBTQIAPN+, que depois foram transferidos para o Clube Caixeral ficando então os bailes Municipais de Carnaval que perduraram muitos anos. O mais incrível desses eventos era o tablado que montavam em cima das poltronas, todo esse material ficava estocado no porão, e que montavam em cima das poltronas, todo esse material ficava estocado no porão, e quem montava era um marceneiro meu conhecido, o seu Zé Luiz, que explorava um restaurante chamado Senadinho (nome dado em função de ser frequentado por vereadores quando a Câmara Municipal funcionava na Biblioteca Pública) localizado na Travessa Ismael Soares (Beco da Kautz), segundo ele, apenas ele sabia a ordem correta das intrincadas peças que sustentavam o assoalho do tal tablado, não duvido que esse material ainda esteja em seus porões. Apesar de visivelmente maltratado o Guarani segue ainda com formaturas e alguns espetáculos esporádicos, o último que assisti lá foi a peça “A Falecida” de Nelson Rodrigues.
Memórias de Breno Correia Filho
Teatro
Avenida
Não costumava ir muito, a primeira vez que entrei foi para assistir ao lançamento da ópera rock “Jesus Cristo Superstar”, casa cheia, grande filme, voltei outros dias para rever. Logo se tornou uma casa de shows, pilares e vigas foram todos pintados de prata lembrando o lendário “Factory de Andy Waroll”, tiveram programações infantis com a “Tia Tuti” no espetáculo “Tuti Fruti” (algo meio que inspirado na Xuxa, minhas filhas adoravam), e grandes bandas se apresentaram lá, Ira, Legião Urbana e o inesquecível show “Apanela do Diabo” com Raul Seixas e Marcelo Nova. Raul morreu dois meses após esta apresentação. Hoje está fechado.
Memórias de Breno Correia Filho
Teatro
Colégio
Gonzaga
Como eterno “Galinha Gorda” (apelido de quem estudou no Gonzaga) não posso esquecer esse teatro que também funcionou como cinema, tendo inclusive por algum tempo sua programação divulgada no Diário Popular junto com os demais cinemas regulares. Assisti em sua tela o clássico “O corcunda de Norte Dame” com Anthony Quinn. Tiveram também apresentações de bandas pelotenses de Rock como “Os Zumbis”, um show dos “Novos Baianos” e a peça “Deu pra tí anos 70”. As formaturas no final de ano eram sempre muito concorridas, durante um tempo contavam com a apresentação de Ballet do Gonzaga da profa. Waldélia Hammenn, onde por muitos anos eu pintava o cenário para seus espetáculos. Tinha também o Grupo de Teatro do colégio, criado pelo já falecido Mauro Moreira (irmão da Tânia Moreira jornalista e Secretária de Comunicação do Governo Estadual), quem sabe um dia este teatro receba o seu nome. Nessas peças eu também pintei cenários e alguma coisa de produção de iluminação. Este palco também serviu para projeção dos festivais de cinema amador realizados pelo Colégio Municipal Pelotense. Lembro que para essas produções estudantis tinha que se que reservar algumas poltronas da primeira fila para os censores, sem contar que para colocar um cartaz de divulgação em um poste precisávamos carimbar um por um no Dep. de Censura que ficava em Rio Grande. Segue com atividades ligadas ao colégio.
Memórias de Breno Correia Filho
Teatro
Colégio
São José
Não era um cinema regular, assisti a apenas um filme lá, mas digno de nota. Foi uma projeção discreta a noite com divulgação “boca a boca” devido a repressão da ditadura militar em que vivíamos, pois, o filme exibido foi “O Encouraçado Potemkin ”. Segue com atividades ligadas ao colégio.
Memórias de Breno Correia Filho
Outros Relatos
Fui assistir Kill Bill (2003) sozinho na sala de cima do Capitólio. Chega outro cara, nos cumprimentamos por educação e ele resolve sentar do meu lado. Não me importei, logo começamos a conversar sobre cinema. Acho que nós dois estávamos empolgados em ver um Tarantino novo e queríamos compartilhar a experiência. Vendo que só tinha duas pessoas na sessão, o senhor projecionista perguntou se a gente não queria conhecer a cabine. Fomos e vimos o projetor enorme, como tudo funcionava, etc. Voltamos e vimos o filme. Foi bem divertido, rimos muito. No final, cada um foi pro seu lado e nunca mais vi o cara.
Roberta Duval
Minha primeira ida ao cinema foi um verdadeiro ritual. Eu estava ansiosa, contando os dias. Fui com minha vó assistir Titanic no Capitólio, aquele cinema charmoso no centro de Pelotas, ali pertinho da Praça Coronel Pedro Osório. Lembro de irmos juntas ao mercado antes da sessão — escolhemos chocolates como quem prepara um banquete para um momento inesquecível. E foi. A emoção do filme se misturava com o carinho de estar ao lado dela, naquele espaço tão imenso e mágico, onde tudo ganhava outra dimensão.
O Capitólio também foi palco de outro marco na minha infância: O Sexto Sentido, que assisti com minha mãe. Eu era pequena, mas fascinada por filmes de terror e mistério. Lembro do silêncio da sala no final, e da surpresa da minha mãe quando percebeu que eu tinha entendido — sozinha — que o personagem já estava morto. Foi a primeira vez que me senti realmente parte daquele universo, como se o cinema me tivesse revelado algo só meu.
Essas sessões não foram apenas momentos de lazer. Foram encontros com as mulheres da minha vida, com o mistério das histórias, com o poder de sentir — medo, encantamento, tristeza, admiração. O Capitólio, para mim, é feito disso: de telas que projetavam muito mais do que filmes. Projetavam vínculos, descobertas e memórias que nunca se apagam.
Bruna Soares Rodrigues
Lembro que além dos borrachudos, a filmagem era interrompida pois a máquina queimava o filme, que tinha que ser cortado e emendado.Outro ponto era quando falta luz e não retornava. Esperávamos um tempo, depois íamos para casa com o direito de retornar no outro dia para assistir o filme.Mesmo assim era muito bom nosso cinema no Laranjal.Outro local que passavam filmes era no Laranjal Praia Clube.
João Francisco de Castro Collares
Não chega a ser muito marcante, mas é datada e pra mim foi uma exceção: me lembro de chegar atrasado, depois do início do filme. Em um dos cinemas mencionados (não lembro agora qual deles), em meados dos anos 1980, tive que entrar com o lanterninha. Em uma dessas ocasiões o filme era Karatê Kid II, e a cena que passava era a que um dos guris dá um soco no vidro de um carro, tentando acertar a cara daquele treinador nojento dos Cobra Kai... Hehehehe! Também lembro de ver, anos antes, quando era bem pequeno, o desenho do Pinóquio (Disney) e que o tamanho da baleia Moby Dick, naquela tela gigante, era uma coisa impressionante. Por volta de 1980 também me marcou uma cena do Flash Gordon em que ele luta com o vilão (MIng?) sobre uma plataforma redonda cheia de pontas viradas pra cima…
Guilherme Campello Tavares
Uma das grandes recordações que eu tenho dos cinemas de rua de Pelotas, foi ter assistido no Cine Pelotense, a Ópera Rock Tommy. O ano era 1975 e o filme foi inspirado no álbum homônimo da banda inglesa The Who, de 1969. O filme Tommy trazia nomes como Elton John, Jack Nicholson e Tina Turner, além de Roger Daltrey, o próprio vocalista do The Who.
O resumo de Tommy:
“Um menino criado no período do pós-guerra na Inglaterra desenvolve surdez e cegueira psicológicas, devido a experiências traumáticas na infância. Habilidoso nos jogos, ganha fama como campeão de fliperama, tornando-se ídolo nacional.”
Saudades dos belos e glamurosos cinemas de rua de Pelotas!
Jefferson Dieckmann
Fui, com meu namorado, assistir a um filme no Tabajara. Cinema novo. Na moda. Na época, era chique andar de "Longuinho". Mas eu, adolescente e mais natural, preferia andar de jeans. Fomos ao cinema, eu bem à vontade. E assim como eu, muitas moças. Ocorre que algumas preferiram ir de longuinho.
Na saída, a moça chique, bem na minha frente, de longuinho e salto alto, pisa na bainha do longuinho e cai estatelada na calçada, bem na porta de saída. Eu estava atrás. Caí na risada. Mas ria tanto, tanto, que não conseguia parar nem para tentar ajudar a pobre moça. Não posso me lembrar que desmancho a rir, novamente. Esta é minha história, do tempo em que o Cine Tabajara era o top dos tops dos cinemas. Deus te abençoe e guarde!
Esqueci de pedir que, caso vás usar, peço anonimato. Não gostaria de que meu nome aparecesse. O nome pode aparecer. Mas o sobrenome, não. Agradeço.
Deus te abençoe e guarde!
Miriam
No final dos anos 1970 ou no início (não tenho certeza), durante a "Sessão das Moças", às quinta-feiras (mulheres não pagavam ingresso) um namorado enciumado entrou no cinema no meio da sessão e disparou contra a ex-namorada. Ela foi ferida e um dos espectadores também. Ele acabou morrendo , a jovem sobreviveu e o atirador foi preso, julgado e condenado.
Luiz Carlos Freitas
Frequentava vários cinemas da cidade, mas o Guarani era o preferido porque ficava mais perto de casa, a uma quadra. Também foi marcante para mim porque foi onde vi o primeiro filme: A Espada Era a Lei. Mais ou menos em 1968, creio, quando o Teatro Guarani já funcionava como cinema, eu tinha lido a história em quadrinhos numa revista Disney e conhecia os personagens, as cores das paisagens, a sequência dos diálogos. Mas ao ver na tela imensa aqueles desenhos se movendo me maravilhei por um momento inicial, em função de estar diante da história se movendo diante dos meus olhos, como se estivesse viva, saída da revista, ou talvez saída da minha memória, e agora com vida própria. O filme já havia começado quando entrei na sala, e a primeira imagem que vi foi a do menino Artur puxando o balde do poço, com o lobo a pouca distância. No resto do filme, o choque inicial foi passando e me acostumei com a nova realidade, de ver o desenho com vida própria desenvolvendo a história, a mesma que eu tinha lido na revista e agora estava acontecendo ao vivo, com vozes, sons e música própria. O prazer da leitura e da imaginação iam ser substituídos pelo prazer desse novo impacto, o da exposição audiovisual. Até hoje vou ao cinema para me aproximar àquela sensação maravilhosa, já que a telinha de TV não tem o mesmo efeito. Mas a primeira vez sempre será a primeira.
Franscisco Antônio Soto Vidal
O Capitólio fechou na época que estava no Ensino Médio, na época no CEFET. Eu tinha o costume de ir todo o Domingo e fiquei muito chateada. Fiz uma redação para a aula de português sobre o fechamento, a professora gostou muito e enviou para a Olimpíada de Português e ganhei o prêmio de melhor redação do município. Saiu no Diário Popular, tirei foto com todos os meus ingressos (ainda tenho, se for útil pra vocês) e contei minha história.
Bruna Ferreira Gugliano
Foram várias as experiências marcantes que tive no Capitólio, desde filmes com filas enormes, como E T e Titanic. Mas a maior de todas aconteceu quando eu era uma adolescente de uns 14 anos. Era o filme Guerra nas Estrelas (ainda não chamavam de Star Wars). Fiquei fascinada pelo filme e totalmente apaixonada pelo Luke Skywalker. Eu fui, em torno de um mês, assistir o filme 11 vezes. Sentava lá, sozinha ou acompanhada, comia minhas balas azedinhas, ouvia aquela música linda de abertura e sonhava. Sonhava muito. O Capitólio marcou demais minha vida. Chorei muito na rua quando ele virou garagem. Sinto falta até hoje!
Simone da Silva Lessa